2014-04-19

UMA SABEDORIA ELEVADA








A palavra “Cristo” quer dizer ungido ou sagrado; isto é, sacerdote e rei. O cristianismo é a religião hierárquica das almas e a monarquia da mais perfeita devoção. O cristianismo primitivo dos apóstolos de Jesus era uma doutrina secreta que tinha seus signos, seus símbolos e seus diferentes graus de iniciação.

Para os santos ou eleitos, o dogma cristão era uma sabedoria elevada e profunda; para os simples catecúmenos, era uma maravilhosa e obscura revelação. Sabemos que o Mestre sempre se exprimia por parábolas e ocultava a verdade sob o véu transparente das imagens, a fim de proteger a nova ciência contra as blasfêmias da ignorância e as profanações da maldade: “Não atirem suas pérolas aos porcos”, dizia ele a seus discípulos, “para que eles não as pisoteiem, e para que, voltando-se contra vocês, não os devorem”. Jesus também não deixou coisa alguma escrita, mas legou a seus apóstolos suas tradições e seu método de ensino.

Ora, eis qual era o fundamento do dogma cristão:

A inteligência é eterna; ela se expande porque é viva. A vida da inteligência, sua expansão, é a palavra, o Verbo. O Verbo é, pois, eterno como a inteligência, e o que é eterno é Deus.

O Verbo manifesta-se pela ação criadora que produz a forma. Ele se reveste da forma humana, e a carne torna-se a vestimenta do Verbo; havia o Verbo mesmo quando não existia a expressão exata: assim o Verbo se fez carne.

O Verbo perfeito é a unidade divina expressa na vida humana. O homem verdadeiro é nosso Senhor, o chefe do qual todos os fiéis são os membros. A humanidade, constituída por uma escala hierárquica e progressiva, tem por chefe aquele que é Deus, porque ele é ao mesmo tempo o melhor dos homens, aquele que morreu pelos outros a fim de reviver em todos. Somos todos, pois, um mesmo corpo cuja alma deve ser a de Jesus Cristo, nosso protótipo e nosso modelo, o Verbo feito carne, o Homem-Deus.

Tudo, portanto, deve em princípio ser comum entre nós, como entre os membros de um mesmo corpo; mas, de fato, cada membro deve se contentar com o lugar que ocupa, e a ordem hierárquica é sagrada, como a vontade de Deus.

Cristo, revelando a lei da unidade, que é a lei do amor, deu ao espírito força para vencer o egoísmo da carne, que é a divisão e a morte; instituiu um signo chamado Comunhão, para opô-lo ao egoísmo, que é o espírito de divisão e de separação.

Ora, a comunhão não era outra coisa senão a caridade representada por uma mesa comum, e como Cristo havia destinado sua carne à dor e à morte para legar a seus fiéis o pão fraterno ao qual ligava, no futuro, seu pensamento perseverante e sua nova vida, dizia-lhes: “Comam todos, esta é a minha carne!” Também dizia do vinho da fraternidade: “Bebam todos, este é o meu sangue, porque eu o derramei inteiramente para assegurar a vocês para sempre a realidade desse signo.”

A comunhão era, pois, a fraternidade divina e humana, e por conseguinte também a liberdade; pois como pode haver opressor entre irmãos cujo pai é o próprio Deus?

O cristianismo era, portanto, a mudança mais radical, e vinha subverter o velho mundo. Isso basta para explicar a necessidade dos mistérios, porque o mundo há mil e oitocentos anos devia estar ainda menos disposto do que hoje a se deixar destruir: ele tinha mais tempo para viver.

Todavia, o Cristo não queria concluir revoluções senão pela força moral, sabendo bem que só essa força não é cega. Ele havia plantado o grão da mostardeira, e dizia a seus discípulos para esperar a árvore. Havia ocultado o fermento na massa, e queria que a deixassem fermentar.

A vida de Cristo estava toda em sua doutrina, e, sobretudo para seus discípulos, sua existência devia ser inteiramente moral. O que dizia, fazia-o no domínio do espírito; é por isso que os livros evangélicos contêm o dogma e a moral em parábolas, e frequentemente o próprio Mestre é o sujeito das narrações alegóricas de seus apóstolos.

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Reproduzido do texto "Jesus Segundo o Talmude", de Eliphas Levi:
http://www.filosofiaesoterica.com/ler.php?id=887#.U1JYi_ldWGw



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