2012-09-09

O QUE É DEUS?







Textos para Reflexão: O que é Deus?


Parte da série "Reflexões sobre a espiritualidade e a ciência", onde o ocultista Marcelo Del Debbio e o cético Kentaro Mori respondem a uma mesma pergunta (a cada post). Para conhecer mais sobre esses dois distintos participantes,
não deixe de ler sobre a premissa da série.


PARTICIPANTES:


>> Marcelo Del Debbio é arquiteto com especializações em semiótica, história da arte e urbanismo, e também um grande pesquisador de mitologia, ordens iniciáticas, astrologia e ocultismo. É editor chefe da Daemon Editora, responsável pelo blog Teoria da Conspiração, membro fundador do Project Mayhem, colunista do blog Sedentário & Hiperativo, dentre outras atividades


>> Kentaro Mori é analista de sistemas e um grande defensor do pensamento cético na web. É responsável pelo projeto Ceticismo Aberto, além de autor do blog 100nexos, um dos administradores da comunidade ScienceBlogs Brasil, colunista do blog Sedentário & Hiperativo, consultor do quadro Detetive Virtual, do Fantástico da Rede Globo, dentre outras atividades.


[RAFAEL] - Tanto na ciência quanto na religião, a humanidade têm se deparado com conceitos que lhes são transcendentes. Tantas foram às interpretações dos deuses ou das leis naturais, que às vezes parece que cada indivíduo tem sua própria visão deles. O que seria então, para você, o conceito de Deus ou de Cosmos?


[MORI] - O Cosmos é tudo aquilo que há, para emprestar a definição de um grande sujeito que falou sobre ele na TV. Etimologicamente o conceito ainda carrega a ideia de ordem e harmonia, desde a Grécia Antiga. Acreditar no Cosmos é assim simplesmente aceitar sua definição englobando todo o Universo; e comprovar ordem e harmonia no mundo talvez só requeira uma olhada no céu noturno com estrelas nascendo e se pondo em uma regularidade que transcende a Humanidade, percebida mesmo por nossos ancestrais mais distantes.

Seria tentador e muito politicamente correto igualar este conceito de Cosmos a Deus, de fato o “Deus de Spinoza” a que Albert Einstein se referiu é muito próximo da ideia de Cosmos de que falamos aqui. O que é um pouco menos conhecido é que o Deus de Spinoza não é apenas mais um tipo de Deus, mas um tipo de Deus definido para rejeitar outros deuses, em particular o tipo de Deus mais popular pelo mundo, o Deus providencial das escrituras. Quando Einstein diz acreditar no Deus de Spinoza, ele não está se incluindo na turma das pessoas que acreditam em Deus, ele está se excluindo.

É preciso questionar conceitos tão abrangentes e flexíveis que acabam perdendo todo seu valor. Uma das primeiras coisas que o ser humano fez no Jardim do Éden, de acordo com a fábula, foi dar nomes aos animais, para diferenciá-los. Carl Sagan, em “Os Dragões do Éden”, interpretou esta fábula como refletindo a importância da linguagem, e é irônico que no pós-modernismo exista essa ideia de que todo significado seja relativo, promovendo um ecumenismo que é em verdade aquilo que George Orwell advertiu com o horror da Novilíngua.

A transcendência que a ciência natural busca, por exemplo, não é a mesma transcendência buscada pela religião – são em verdade conceitos mutuamente exclusivos. A transcendência religiosa está por definição além daquela perscrutável pela ciência natural, que sempre estará limitada por aquilo que possa ser comprovado e observado no mundo que nos cerca. Na religião, se acredita em algo porque é absurdo, do contrário se estará apenas constatando algo. São palavras iguais, mas com usos e definições muito diferentes. Forçar o entendimento de conceitos mesmo contraditórios como parte de uma única ideia é mesmo parte do Duplipensar de Orwell, o ponto cego onde o raciocínio pode ser extinto.

Um ecumenismo politicamente correto onde “todos acreditam em deus de sua própria forma” é um uso político e totalitário da linguagem. Não, quem acredita no deus das escrituras não pode, ao mesmo tempo, considerar que aquele que acredita em Shiva também acredita em deus, ou que aquele físico que diz acreditar no deus de Spinoza também seja teísta. São crenças explicitamente contraditórias.

A verdadeira tolerância é reconhecer estas contradições e respeitar o direito que cada um tem a suas próprias crenças – e descrenças. O Cosmos em que acredito, a ordem e harmonia no mundo que vejo e comprovo, não é deus. É um conceito que se afirma tanto em si mesmo, quanto pela exclusão de outras ideias, que conheço, mas não compartilho com outras pessoas quem, todavia, respeito.

Eu sou ateu.


[DEL DEBBIO] - Para os Hermetistas e Cabalistas, Deus é o Universo. A soma de tudo.

Nada de velhinhos barbudos preocupados com o que você faz com a sua genitália; nada de seres relampejantes ou divindades com múltiplos braços, mas a soma de tudo o que pode ser compreendido dentro deste Universo: galáxias, sóis, planetas, continentes, países, estados, cidades, comunidades, casas e, finalmente, cada indivíduo, que passa a ser o deus criador de suas próprias idéias e de todas as ações conscientes, em um fractal infinito de possibilidades.

Para os hermetistas, “Deus” se divide primordialmente em Sabedoria e Entendimento: duas partes que interagem entre si.

Os antigos chineses chamavam estas partes de Yin e Yang; os gregos de Ordem e Caos; os nórdicos de Gelo e Fogo; os católicos de Anjos e Demônios e os cientistas chamam de Física/Matemática e Evolução. Os Cabalistas chamam estas Esferas de Hochma e Binah.

Hochma (a Evolução, Caos, Yang, Fogo, mutação, o Esperma) é compreendida pelos cabalistas como “Sabedoria” porque está associada à idéia de que a sabedoria vem de descobrir algo novo que não estava lá antes.

Como Deus se manifesta de maneira fractalizada, este conceito pode ser aplicado desde as regras de evolução de Darwin até os memeplexes de Dawkins; pode ser aplicado desde as mutações genéticas que desenvolveram toda a miríade de seres vivos diferentes no planeta (uma mutação faz com que algo novo surja dentro da repetição genética) até as variações físicas responsáveis pela gama de estrelas diferentes no universo e a maneira como as formas das galáxias evoluem dependendo da região do cosmos onde estejam. E pode ser aplicada também a uma criança de dois anos que aprende pela primeira vez uma palavra nova.

Binah (As regras, Ordem, Yin, Gelo, o Imutável, o Óvulo) é compreendida pelos cabalistas como “Entendimento” porque está associada à idéia de que somente entendemos o mundo através do processo científico, de escolha, teste e repetição controlados. Binah é a matemática, a física teórica, as regras rígidas e imutáveis que guiam nosso universo e nos permitem “prever” acontecimentos pela certeza de sua repetição (se nada for alterado). Binah é a escolha de UM universo para trabalharmos. Em outros universos, as regras são outras (em outras cabeças, outras idéias)…

A título de curiosidade, a intersecção simbólica entre estas duas Esferas, Hochma e Binah, é feita através da letra “Daleth” que quer dizer “Porta” (a porta de entrada de um universo maior/Hochma para um universo menor/Binah – do deserto para sua cabana, por exemplo) e representa a própria natureza (o Arcano da Imperatriz no tarot). A partir daí, quando Olhamos para cima, temos Kether (“Deus”), quando olhamos para baixo, temos Daath (“Conhecimento”).

Desta maneira, o conceito de “Deus” para os hermetistas depende da escala que você quer trabalhar. O Universo é Deus, mas eu também sou Deus, e o ato de escolher e preparar o meu jantar hoje de noite é Deus; e isso independe de qualquer crença ou descrença.

O problema começa quando as pessoas tentam compreender o que é esta grandiosidade de sensações e experiências através do artifício da antropomorfização (dar forma humana a fenômenos naturais) para tentar explicar o que não pode ser mensurável.

A partir deste momento, a definição e imagem de “Deus” varia de acordo com fatores culturais, temporais, artísticos e espaciais: africanos entendiam esta dicotomia Ordem/Caos como Xangô/Iansã e associavam isto à Montanha (imutável) e à tempestade (caótica), Babilônicos tinham Ea (céu azul e limpo) e Lillith (a tempestade), Egípcios tinham Maat (A Justiça) e Ptah (O escriba de todas as possibilidades), Gregos tinham Ouranos e Nix, Nórdicos tinham Ymir (gigante do gelo) e Surtur (gigante do fogo), católicos têm Adão (deu nome para todas as coisas vivas) e Eva (comeu o fruto da árvore proibida e fez com que fossem expulsos do Paraíso), hindus tem Vishnu e Shiva, os thelemitas têm Therion e Babalon… Dezenas de mitos diferentes; mesmas idéias.

O GRANDE problema acontece quando pessoas resolvem transformar Símbolos em Deuses Literais (que, sendo literais, permitem “crença” ou “descrença”) e os manipulam para impor e manter seus poderes econômicos e políticos sobre a população… Mas isto é uma outra história.


Fonte: Textos para Reflexão
http://textosparareflexao.blogspot.com/2011/11/o-que-e-deus.html
Autor: Kentaro Mori, Marcelo Del Debbio e Rafael Arrais
Editor: Eduardo Patriota Gusmão Maria De Fatima Soare



FUI CHAMADA DE HEREGE, E AGORA?






Heresia
(do latim haerĕsis, por sua vez do grego αἵρεσις, "escolha" ou "opção") é a doutrina ou linha de pensamento contrária ou diferente de um credo ou sistema de um ou mais credos religiosos que pressuponha(m) um sistema doutrinal organizado ou ortodoxo. A palavra pode referir-se também a qualquer "deturpação" de sistemas filosóficos instituídos, ideologias políticas, paradigmas científicos, movimentos artísticos, ou outros. A quem funda uma heresia dá-se o nome de heresiarca. ( Wikipédia, a enciclopédia livre. )


A pessoa que consegue compreeder e ser tolerante para com tudo e todos, também já aprendeu a transitar livremente por entre a enorme multiplicidade das manifestações nos mundos.

Se ela for de uma natureza extrovertida, expositiva e gostar das bajulações, atrairá para si a atenção e simpatia das massas, ainda que por motivos duvidosos. Mas se ao contrário, sua natureza for introvertida, introspectiva e avessa às bajulações de títulos, atrairá para si o desprezo e a crítica dessas mesmas massas.

Essa pessoa despertará a ira dos fanáticos ( sejam eles religiosos, filósofos, ateus, políticos, e até dos " carneiros incautos " ), porque aceitá-la como ser pensante que já saiu das crenças cegas, dependências e servidão conveniente, para a liberdade de Fé e autonomia pessoal obriga-os a questionar suas próprias convicções.

O fervor filosófico, o religioso; de qualquer tipo de crença religiosa ou não religiosa ( incluindo tudo o que nega, ou não objetiva a ascensão espiritual ), quando praticado de forma exacerbada e intolerante é uma arma de destruição, sempre disposta a disparar contra quem pensa de modo diverso.

Em vez de unir, divide a sociedade, semeando o ódio que mina dia a dia a sua confiança, sua ética e sua moral, gerando como resultado as perseguições e os massacres.

Tudo deve ser questionado: A política, a economia, a ciência, a filosofia, o ateísmo, a religião e etc, pois são apenas conceitos humanos que necessitam do auto-posicionamento social.

E como conceitos, estão sujeitos à equívocos, à ilusões, e não passam de peças de um quebra-cabeça que é o " elefante " da fábula, ou seja dA Verdade.

Há que se duvidar das fórmulas acabadas, das receitas prontas. É preciso que se aprenda a usuflui-las apenas como instrumento de auto- análise, pois somente um constante questionamento interno ( dentro de si ), na meditação ( me- dit- a- ção ) é possível despertar o princípio da sabedoria latente em toda Natureza.

Contudo, não basta questionar-se e ir em busca de respostas. Há a necessidade da aplicação prática, no cotidiano, no dia a dia, das respostas na medida em que forem sendo encontradas. Se isso não for feito, a busca se torna tão inútil e perigosa quanta a ilusão, pois igualmente acabam virando instrumentos de manipulações.

Ilustremos isso com uma piada que serve ao propósito:

" Um desequilíbrio orgânico leva um matuto ao médico que, diagnosticando o mal fornece-lhe uma receita com a prescrição do remédio corretivo. O médico orienta-o dizendo que ele terá de tomar aquela receita duas vezes ao dia, durante sete dias.

Ao final de sete dias, sem obter melhora, o matuto volta ao médico e reclama que o remédio não fez efeito. O médico pergunta-lhe se tomou o remédio receitado corretamente, ao que o matuto garante que tomou até o último pedacinho do famigerado papel.

Só então o médico percebe o engano do paciente. "


A pessoa que vive na ilusão é semelhante ao matuto em vez de interpretar o que os signo no papel indicam, tomam as recomendaçoes ao pé da letra, agravando seu estado pelo prolongamento do mal que lhe acomete.

Já aquele que se auto-questiona e busca respostas poderá se desdobrar em dois tipos: um indo ao médico, sai com a receita, vai à farmácia e obtem o remédio, mas esquece de tomá-lo. O outro sai com a sensação de dever cumprido, então põe a receita no bolso e a esquece.

O resultado no final é o mesmo para os três

Ouve-se muito a palavra buscador nos meios em que se auto-denominam estudiosos de x ou y, e a maioria realmente se lança numa busca desenfreada; peregrinando em cursos de toda gama, em livrarias, bibliotécas, sebos e até em viagens " iniciáticas " porque seu entendimento do que seja um Buscador assemelha-se a receita do matuto.

Outros até conseguem perceber do que se trata, mas falta-lhes a aplicação real, ou seja, comprar e tomar o remédio correto.

O verdadeiro auto-Conhecimento só é possível com a experimentação, com a aplicação correta das respostas encontradas. E somente o auto- Conhecimento levará à Liberdade que só a Sabedoria pode dar.

Ashra/VSL




Esquizofrenia






- Parte XVII - A Conexão Espiritual


Na psiquiatria moderna, os conhecimentos das funções cerebrais, é fator essencial para entendermos as possíveis origens dos distúrbios mentais, quais a maioria dos diagnósticos se restringem a meras especulações padronizadas no mundo todo.


Apesar dos estudos estar no início, podemos dizer que atualmente, existem técnicas e equipamentos capazes de nos fornecer resultados diferenciados, no que se referem aos distúrbios mentais de origem somática, incluindo a má formação genética, mesmo esta não sendo hereditária.


Muitos hospitais e clínicas, dispõem da Tomografia Computadorizada (TC), a Ressonância Magnética (RM), e a recente Tomografia por Emissão de Positróns (TEP), que através do scaneamento, o profissional pode medir o fluxo sanguíneo em algumas unidades do cérebro, porém, convém esclarecer que o baixo fluxo de oxigênio em qualquer área do cérebro, pode provocar significativas alterações comportamentais, inclusive sintomas e formação de doenças; entretanto, apesar de toda a evolução tecnológica a medicina não dispõe de equipamentos para medir a insuficiência de oxigênio, e que pode levar os indivíduos a manifestarem sintomas conversivos.


A conversão é um mecanismo através do qual o indivíduo converte inconscientemente um conflito psicológico em doença física, ou física em psicológica, e devido a estes fatores, são necessárias avaliações minuciosas, para que os acometidos por distúrbios mentais não interpretem conforme as conveniências de manipulação, e venham intensificar e dramatizar os comportamentos já considerados inadequados.

O mesmo acontece com alguns termos mal aplicados; exemplo:
O termo distúrbio psicológico não possui uma definição precisa, porém, é utilizada indiscriminadamente por profissionais da área mental, para facilitar ou fugir da explicação dos fatores que envolvem o biológico, o ambiental, o social e o psicológico, quando o acometido apresenta alterações e transferências recorrentes.

Citarei neste artigo um breve exemplo:

Os indivíduos com personalidade paranóide, geralmente são atingidos pelas conversões, por projetarem seus próprios conflitos e hostilidades em outros indivíduos.

Embora que não estejam incluídos na classe da psicopatia, eles são frios e indiferente nos seus relacionamentos, tendem a encontrar intensões hostis por trás de atitudes triviais e até mesmo em atos positivos; a reação típica é a desconfiança, e agem com agressividade quando se sentem rejeitados, mesmo quando a rejeição é gerada por eles próprios.

É comum os paranoides, disseminarem a discórdia entre os indivíduos que os rodeiam.


Segundo os cientistas do Reino Unido, este distúrbio pode ser controlado, por ele estar ligado ao baixo fluxo de oxigênio no cérebro.

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Jorge Guedes
- Brasileiro, nascido em 1959, Iniciou suas pesquisas no Brasil, Reside em Portugal desde 2003, Fundador do EEIJG (Espaço da Espiritualidade Independente Jorge Guedes) Pesquisador, P.h.D. em Neurociências pela Universidade de Tel Aviv – Israel, Psicoterapeuta, filiado ao SINTE (CRT 30610) no ano de 1989, com as pesquisas da Regeneração das Células-Tronco, Criando as Técnicas da Terapia da Eletrogenese e a Terapia Bio Celular In Vivo.

Página pessoal:
Jorge Guedes.

Todos os direitos autorais reservados ao autor.


2012-09-06

Sobre a Liberdade







Sei que é inútil tentar discutir os juízos de valores fundamentais. Se alguém aprova como meta, por exemplo, a eliminação da espécie humana da face da Terra, não se pode refutar esse ponto de vista em bases racionais.


Se houver porém concordância quanto a certas metas e valores, é possível discutir racionalmente os meios pelos quais esses objetivos podem ser atingidos. Indiquemos, portanto, duas metas com que certamente estarão de acordo quase todos os que lêem estas linhas.

1. Os bens instrumentais que servem para preservar a vida e a saúde de todos os seres humanos devem ser produzidos mediante o menor esforço possível de todos.

2. A satisfação de necessidades físicas é por certo a precondição indispensável de uma existência satisfatória, mas em si mesma não é suficiente. Para se realizar, os homens precisam ter também a possibilidade de desenvolver suas capacidades intelectuais artísticas sem limites restritivos, segundo suas características e aptidões pessoais.

A primeira dessas duas metas exige a promoção de todo conhecimento referente às leis da natureza e dos processos sociais, isto é, a promoção de todo esforço científico. Pois o empreendimento científico é um todo natural, cujas partes se sustentam mutuamente de uma maneira que certamente ninguém pode prever.

Entretanto, o progresso da ciência pressupõe a possibilidade de comunicação irrestrita de todos os resultados e julgamentos – liberdade de expressão e ensino em todos os campos do esforço intelectual.

Por liberdade, entendo condições sociais, tais que, a expressão de opiniões e afirmações sobre questões gerais e particulares do conhecimento não envolvam perigos ou graves desvantagens para seu autor.

Essa liberdade de comunicação é indispensável para o desenvolvimento e a ampliação do conhecimento científico, aspecto de grande importância prática. Em primeiro lugar, ela deve ser assegurada por lei.

Mas as leis por si mesmas não podem assegurar a liberdade de expressão; para que todo homem possa expor suas idéias sem ser punido, deve haver um espírito de tolerância em toda a população.

Tal ideal de liberdade externa jamais poderá ser plenamente atingido, mas deve ser incansavelmente perseguido para que o pensamento científico e o pensamento filosófico, e criativo em geral, possam avançar tanto quanto possível.

Para que a segunda meta, isto é, a possibilidade de desenvolvimento espiritual de todos os indivíduos, possa ser assegurada, é necessário um segundo tipo de liberdade externa.

O homem não deve ser obrigado a trabalhar para suprir as necessidades da vida numa intensidade tal que não lhe restem tempo nem forças para as atividades pessoais.

Sem este segundo tipo de liberdade externa, a liberdade de expressão é inútil para ele. Avanços na tecnologia tornariam possível esse tipo de liberdade, se o problema de uma divisão justa do trabalho fosse resolvido.

O desenvolvimento da ciência e das atividades criativas do espírito em geral exige ainda outro tipo de liberdade, que pode ser caracterizado como liberdade interna.

Trata-se daquela liberdade de espírito que consiste na independência do pensamento em face das restrições de preconceitos autoritários e sociais, bem como, da “rotinização” e do hábito irrefletidos em geral.

Essa liberdade interna é um raro dom da natureza e uma valiosa meta para o indivíduo. No entanto, a comunidade pode fazer muito para favorecer essa conquista, pelo menos, deixando de interferir no desenvolvimento.

As escolas, por exemplo, podem interferir no desenvolvimento da liberdade interna mediante influências autoritárias e a imposição de cargas espirituais aos jovens excessivas; por outro lado, as escolas podem favorecer essa liberdade, incentivando o pensamento independente.

Só quando a liberdade externa e interna são constantes e conscienciosamente perseguidas há possibilidade de desenvolvimento e aperfeiçoamento espiritual e, portanto, de aprimorar a vida externa e interna do homem.

Parte I

Durante o século passado e em parte do que o precedeu, a existência de um conflito insolúvel entre conhecimento e crença foi amplamente sustentada. Prevalecia entre mentes avançadas a opinião de que chegara a hora de substituir, cada vez mais, a crença pelo conhecimento; toda crença que não se fundasse ela própria em conhecimento era superstição e, como tal, devia ser combatida.

Segundo essa concepção, a função exclusiva da educação seria abrir caminho para o pensamento e o conhecimento, devendo a escola, como o órgão por excelência para a educação do povo, servir exclusivamente a esse fim.

É provável que raramente, ou mesmo nunca, possamos encontrar o ponto de vista racionalista expresso com tanta crueza; pois todo homem sensível veria de imediato o quanto essa formulação é tendenciosa. Mas é conveniente formular uma tese de maneira nua e crua quando se quer aclarar a própria mente com relação a sua natureza.

É verdade que a experiência e o pensamento claro são a melhor maneira de fundamentar as convicções. Quanto a isto, podemos concordar irrestritamente com o racionalista extremado.

O ponto fraco dessa concepção, contudo, é que as convicções necessárias e determinantes para nossa conduta e nossos juízos não podem ser encontradas unicamente nessa sólida via cientifica. Pois o método cientifico não nos pode ensinar outra coisa além do modo como os fatos se relacionam e são condicionados uns pelos outros.

A aspiração a esse conhecimento objetivo está entre as mais elevadas de que o homem é capaz, e certamente ninguém pode suspeitar que eu deseje subestimar as realizações e os heróicos esforços do homem nessa esfera.

É igualmente claro, no entanto, que o conhecimento do que é, não abre diretamente a porta para o que deve ser. Podemos ter o mais claro e completo conhecimento do que é, sem contudo sermos capazes de deduzir disso qual deveria ser a meta de nossas aspirações humanas.

O conhecimento objetivo nos fornece poderosos instrumentos para atingir certos fins, mas a meta final em si é a mesma, e o desejo de atingi-la devem emanar de outra fonte.

E é praticamente desnecessário defender a idéia de que nossa existência e nossa atividade só adquirem ‘sentido’ mediante o estabelecimento de uma meta como essa e dos valores correspondentes.

O conhecimento da verdade como tal é maravilhoso, mas é tão pouco capaz de servir de guia que não consegue provar sequer a justificação e o valor da aspiração a esse mesmo conhecimento da verdade.

Aqui defrontamos, portanto, com os limites da concepção puramente racional de nossa existência. Mas não se deve presumir que o pensamento inteligente não possa desempenhar nenhum papel na formação da meta e de juízos éticos. Quando alguém se dá conta de que certo meio seria útil para a consecução de um fim, isto faz com que o próprio meio se torne um fim.

A inteligência elucida para nós a inter-relação entre meios e fins. O mero pensamento não pode, contudo, nos dar uma consciência dos fins últimos e fundamentais.


Elucidar esses fins e valores fundamentais é engastá-los firmemente na vida emocional do indivíduo; parece-me, precisamente, a mais importante função que a religião tem a desempenhar na vida social do homem.

E se alguém pergunta de onde provém a autoridade desses fins fundamentais, já que eles não podem ser formulados e justificados puramente pela razão, só há uma resposta: eles existem numa sociedade saudável na forma de tradições vigorosas, que agem sobre a conduta, as aspirações e os juízos dos indivíduos; eles existem, isto é, vivem dentro dela, sem que seja preciso encontrar justificação para sua existência.

Nascem, não através da demonstração, mas da revelação, por meio de personalidades excepcionais. Não se deve tentar justificá-los, mas antes, sentir, simples e claramente, sua natureza.

Os mais elevados princípios para nossas aspirações e juízos nos são dados pela tradição religiosa (...). Trata-se de uma meta muito elevada, que, com nossos parcos poderes, só podemos atingir de maneira muito insatisfatória, mas que da um sólido fundamento a nossas aspirações e avaliações.

Se quiséssemos tirar essa meta de sua forma religiosa e considerar apenas seu aspecto puramente humano, talvez pudéssemos formulá-la assim: desenvolvimento livre e responsável do indivíduo, de modo que ele possa por suas capacidades, com liberdade e alegria a serviço de toda a humanidade.

Não há lugar nisso para a divinização de uma nação, de uma classe, nem muito menos de um indivíduo. Não somos todos filhos de um só pai, como se diz na linguagem religiosa?

Na verdade, mesmo a divinização da humanidade, como totalidade abstrata, não estaria no espírito desse ideal. E somente ao indivíduo que é dada uma alma. E o ‘sublime’ destino do indivíduo é antes servir que comandar, ou impor-se de qualquer outra maneira.

Se considerarmos mais a substância que a forma, poderemos ver também nestas palavras a expressão da postura democrática fundamental. Ao verdadeiro democrata é tão inviável idolatrar sua nação quanto ao homem religioso, no sentido que damos ao termo.

Qual será então, em tudo isto, a função da educação e da escola? Elas devem ajudar o jovem a crescer num espírito tal que esses princípios fundamentais sejam para ele como o ar que respira.

O mero ensino não pode fazer isso. Se mantemos esses princípios elevados claramente diante de nossos olhos, e os comparamos com a vida e o espírito de nosso tempo, revela-se flagrantemente que a própria humanidade civilizada encontra-se, neste momento, em grave perigo.

Nos Estados totalitários, são os próprios governantes que se empenham hoje em destruir esse espírito de humanidade. Em lugares menos ameaçados, são o nacionalismo e a intolerância, bem como a opressão dos indivíduos por meios econômicos, que ameaçam sufocar essas tão preciosas tradições.

A clareza da enormidade do perigo está se difundindo, no entanto, entre as pessoas que pensam, e há uma grande procura de meios que permitam enfrentar o perigo – meios no campo da política nacional e internacional, da legislação, da organização em geral.

Esses esforços são, sem dúvida, extremamente necessários. Contudo, os antigos sabiam algo que parecemos ter esquecido.

“Todos os meios mostram-se um instrumento grosseiro quando não tem atrás de si um espírito vivo”.


Se o desejo de alcançar a meta estiver vigorosamente vivo dentro de nós, porém, não nos faltarão forças para encontrar os meios de alcançar a meta e traduzi-la em atos.


Albert Einstein


NOTA 1: Encontrei este texto entre outros que tenho quardados e não me lembro de onde ele veio. Há uma atribuição a Albert Ainstein, contudo eu não tenho certeza.

NOTA 2:
Todos os destaques são de MÉDIUM.


2012-09-02

Mediuns - Revista Super Interessante







Médiuns

Eles falam com espíritos, prevêem o futuro, resolvem mistérios e curam doenças. Ou pelo menos acreditam fazer tudo isso


“Não me conte nada sobre o caso.” Foi assim que Noreen Reiner recebeu o investigador Joe Uribe em sua casa, na Flórida, em 1993. O caso em questão era o assassinato do auditor fiscal Walter Sullivan, 4 anos antes. Noreen, uma médium investigativa, pegou o cinto e o relógio que a vítima usava quando morreu e fechou os olhos. De repente, começou a convulsionar, em uma espécie de transe, e falou: “Estão batendo em mim, estou muito machucado, acho que atiraram na minha nuca.” Quando voltou a si, ela sabia descrever com detalhes o rosto do assassino, o de sua mulher, o local da morte e o esconderijo da arma do crime. “Nunca acreditei nesse tipo de coisa”, diz o investigador Joe Uribe. “Mas resolvi ir atrás. E descobri que ela tinha acertado até o último detalhe, inclusive a cor da casa do assassino.” O culpado, Eugene Moore, confessou o crime e só não acabou atrás das grades porque foi morto enquanto tentava fugir da polícia.

Nem todos os médiuns são como a americana Noreen Reiner. Há os que psicografam mensagens que viriam de espíritos, como o brasileiro Chico Xavier (1910-2002), os que pintam quadros inspirados por uma força que não conhecem e ainda aqueles que acreditam prever o futuro. “Médium”, que em latim significa “aquele que está no meio”, é a palavra usada pelo espiritismo para designar pessoas que seriam um elo entre o mundo dos vivos e o dos mortos. Mas a figura ultrapassa a fronteira dessareligião.
Acredita-se que os médiuns façam parte da nossa cultura há pelo menos 100 mil anos, quando os homens de Neandertal começaram a enterrar seus mortos e, um pouco depois, quando os Homo sapiens inauguraram a noção de consciência de si mesmo, tornando-se capazes de se colocar um no lugar do outro. “Quando surge a capacidade de imaginação e abstração, começam também a se criar mundos que não existem no plano visível”, diz Silas Guerriero, professor de ciências da religião da PUC de São Paulo. Como o mundo não era fácil para o homem pré-histórico, quem tinha alguma sensibilidade especial acabava virando um líder que ajudava na hora de enfrentar grandes períodos de chuva ou de seca, curar doenças ou arranjar comida. Assim surgiram os xamãs, profissionais dedicados a conversar com o lado de lá para resolver os problemas de cá – por meio de sacrifícios ou orações. “A necromancia, a comunicação com os mortos, é um dos hábitos mais antigos que existem”, afirma Antonio Flávio Pierucci, professor de sociologia da religião da USP.
Entre os gregos, os oráculos faziam previsões sagradas. Os pajés guaranis conversavam com deuses, assim como os feiticeiros do candomblé ou os líderes bíblicos. É o caso de Moisés, que está na raiz do cristianismo, do islamismo e do judaísmo. A Bíblia conta que, ao subir no monte Sinai, Moisés falou diretamente com Deus e recebeu dele os 10 Mandamentos. Para os sociólogos da religião, o fenômeno foi o que chamamos de mediunidade.
Hoje, a vida pode estar um pouco mais fácil, mas os médiuns seguem fascinando e tentando ajudar quem enfrenta problemas sem saída. Estão em séries de TV, novelas e livros – segundo a Federação Espírita Brasileira, 38,6 milhões de livros espíritas foram vendidos nos últimos anos. Quando uma história de mediunidade aparece, vem sempre cercada de enigmas. Eles conseguem mesmo fazer o que dizem? Se conseguem, como explicar essa dádiva? A seguir, veja como a ciência tenta encontrar respostas, começando pelo modo como pessoas comuns se descobrem médiuns.


Cérebros em êxtase
Os cientistas acreditam que o cérebro explica a mediunidade. mas não sabem dizer como.
De repente, coisas estranhas ocorrem. A pessoa vê vultos inexplicáveis, ouve vozes de gente que não aparece ou faz previsões que, de tão acertadas, não parecem ser apenas coincidência. “Na primeira vez que aconteceu, fiquei com tanto medo que passei anos sem contar para ninguém”, diz Claudia Rosa (ao lado), que desde os 12 anos vive experiências de mediunidade. Depois dos momentos de susto, chega a hora de deixar de negar o fenômeno e tentar conviver com ele. Os brasileiros que acreditam ter dons mediúnicos geralmente procuram centros espíritas – há 14 mil deles no país – e acabam conhecendo gente com histórias parecidas. “Lendo livros e participando de treinamentos, o médium consegue desenvolver sua habilidade”, diz Marta Antunes, diretora da Federação Espírita Brasileira. “Mas, quando a mediunidade é exuberante, você não pode evitá-la.” As imagens de espíritos ou a inspiração para escrever uma carta costumam aparecer do nada, como um déjà vu, na hora em que a pessoa menos espera. É como dizia o médium Chico Xavier: “O telefone toca sempre de lá para cá”.
Na tentativa de ligar daqui para lá, muitas reli giões do planeta criam rituais e provocam um momento de êxtase: o transe. Para os médiuns, o transe é o ponto alto de sua habilidade, quando conseguem incorporar um espírito. Para os psiquiatras, é um estado alterado de consciência, assim como a hipnose, que se atinge após um longo processo de concentração. Rituais com danças frenéticas, mantras, estímulos luminosos, jejum prolongado e até plantas alucinógenas fariam o participante sair de si. “O indivíduo entra em um estado de consciência paralelo ao comum e se comporta da maneira adequada àquele contexto”, diz Paulo Dalgalarrondo, professor de psicopatologia na Unicamp. Símbolos e palavras específicas formam um mundo diferente do corriqueiro, que a pessoa passa a entender quando entra em transe. “O ritual pode parecer caótico, mas na verdade tem regras e símbolos próprios”, diz José Francisco Bairrão, filósofo e psicólogo social da Unicamp especializado em estudos afro-brasileiros.
Uma boa forma de desvendar a mediunidade é entender como rituais levam ao transe e como o transe resulta nos relatos de contato com os espíritos. Por isso, os cientistas tentam estudar o que acontece no cérebro durante esse momento único. A busca tem duas frentes. Numa delas há espíritas que tentam explicar e comprovar cientificamente a mediunidade. É o caso do psiquiatra Sérgio Felipe Oliveira, professor de medicina e espiritualidade da USP e membro da Associação Médico-Espírita de São Paulo. Segundo ele, a glândula pineal é a responsável pela interatividade com o mundo dos espíritos. Do tamanho de uma ervilha, a pineal fica no centro do cérebro e produz a melatonina, hormônio que regula o sono. “É um órgão sensorial capaz de converter ondas eletromagnéticas em estímulos neuroquímicos”, diz. Oliveira acredita que as pessoas que dizem sofrer possessões têm na pineal uma quantidade maior de cristais de apatita, um mineral parecido com o esmalte dentário. Quanto mais cristais, maior seria a sensibilidade espiritual.
Na outra frente, estão neuropsicólogos que usam exames de ressonância magnética e tomografias para tentar entender que mecanismos o cérebro aciona durante os rituais religiosos. O neurocientista Mario Beauregard, da Universidade de Montreal, no Canadá, estudou o cérebro de 15 freiras carmelitas enquanto elas rezavam. Achou uma dezena de pontos ativados, especialmente nas áreas relacionadas à emoção, orientação corporal e consciência de si próprio. Já o radiologista Andrew Newberg, da Universidade da Pensilvânia, nos EUA, mapeou a ativação cerebral de monges budistas. Analisando tomografias dos religiosos durante a meditação, Newberg notou que a área relacionada à orientação corporal é quase toda desativada, o que pode justificar a sensação relatada de desligamento do corpo. Ele também estudou freiras franciscanas durante longas preces. Descobriu que o fluxo sanguíneo do lóbulo parietal esquerdo, parte responsável pela orientação, caía bruscamente. Para Newberg, as irmãs experimentavam a sensação de união com Deus porque o cérebro delas deixava de fazer a separação do próprio corpo com o mundo.
Mas nenhuma das duas frentes de pesquisa tem explicações definitivas para os efeitos do transe. Por isso, as origens fisiológicas da mediunidade seguem sendo um mistério. “A grande pergunta é: há uma base única para todos os transes? O que a neuropsicologia tem indicado é que não”, afirma Paulo Dalgalarrondo.


O dom da cura
É possível curar doenças graves em cirurgias espirituais que duram menos de um minuto?


Todo dia, a sede da Federação Espírita de São Paulo (Feesp) recebe cerca de 7 mil pessoas, a maioria em busca de auxílio espiritual para curar uma doen ça. Muitas acabam assistindo a uma palestra sobre a doutrina espírita e tomando um passe, uma espécie de energização oferecida pelos médiuns. Já os casos mais graves são selecionados para um tratamento diferente: a cirurgia espiritual, como a que acontece no Centro Espírita Caminho da Luz nas quintas-feiras à noite. Lá, numa sala escura, 10 médiuns ficam sentados com os olhos fechados e as mãos espalmadas para cima. Deitado numa cama, o paciente é coberto com um lençol até metade do corpo. Dois médiuns permanecem perto dele, percorrendo as mãos pela parte do corpo que será operada, mas nunca tocando no paciente. Segundo a doutrina espírita, essa sessão, que dura menos de um minuto, serve para mandar energias espirituais ao doente. “Um fluido, uma espécie de névoa, sai do nariz, da boca, das mãos dos médiuns, vai enchendo a sala e então é transferido para a pessoa”, explica o engenheiro mecânico Eduardo José Monteiro (na foto ao lado), organizador da ala cirúrgica do centro. São 40 pessoas operadas a cada noite e outras 70 que passam por uma espécie de consultório espiritual – e a maioria costuma sair de lá satisfeita.
Uma pesquisa de 1999, feita por Cleide Canhadas, mestra em ciências de religião, mostrou que 86% das pessoas que procuravam centros espíritas em São Paulo tinham algum problema de saúde. Desses, 42% tinham distúrbios emocionais ou psíquicos, 12% câncer ou aids e 15% problemas ginecológicos, abdominais ou glandulares. “Constatei que essas pessoas foram ao centro não por falta de opções, mas porque estavam insatisfeitas com o tratamento tradicional”, afirma Cleide. De 115 entrevistados que participaram da pesquisa, todos disseram que melhoraram depois da visita ao centro.
Se 100% das pessoas se sentiram melhor depois dos rituais de cura, como a ciência explica esse sucesso?
Na verdade, a ciência mal tenta explicar. Primeiro, porque a cura espírita descrita acima é um fenômeno exclusivamente nacional – o Brasil é o único país do mundo onde o espiritismo virou uma doutrina cristã, com milhões de seguidores. Isso faz com que nenhum grande centro internacional de pesquisa médica se interesse pelo tema. Segundo, porque mesmo por aqui há pouco interesse no assunto. “É difícil conseguir financiamento público para esse tipo de pesquisa”, diz Frederico Camelo Leão, psiquiatra do Núcleo de Estudos de Problemas Espirituais e Religiosos da USP. “Os recursos são limitados e temos de disputar o dinheiro com assuntos mais visados, como o genoma, por exemplo.”
As poucas teses sobre o benefício da cura espiritual apontam numa direção: efeito placebo. Se o tratamento traz benefícios psicológicos para o paciente, acaba tendo efeitos reais no corpo, assim como um remédio de mentira, um placebo. E os benefícios se concentrariam em 3 alterações fisiológicas:
1) Mudanças no sistema nervoso autônomo, responsável por nossos movimentos involuntários, como a respiração e os batimentos cardíacos. Doenças desencadeadas ou agravadas por causas emocionais (como asma, alergia e taquicardia) podem ter grande melhora com o tratamento espiritual, já que estão fortemente ligadas a fatores psicológicos.
2) Se a pessoa se sentir mais protegida, o sistema imunológico, responsável pela defesa do corpo, pode produzir mais linfócitos T, anticorpos essenciais no combate a algumas doenças, como o câncer.
3) A calma que o tratamento espiritual traz pode influenciar o sistema endócrino a produzir mais hormônios que auxiliam o tratamento de males como o estresse e a ansiedade.
Essas mudanças, que têm origem no cérebro e efeito por todo o corpo, acontecem com mais intensidade dependendo dos detalhes do ritual de cura. “Assim como o placebo tem de ser amargo e de um formato especial para fazer efeito, a cura espiritual também depende de um trabalho psicológico bem feito”, afirma Renato Sabbatini, professor de medicina da Unicamp. E também do quanto a pessoa acredita no processo. “O tratamento só funciona quando inserido num contexto cultural. Não faria o menor efeito em um norueguês, por exemplo, mas faz todo sentido para os brasileiros porque faz parte da nossa cultura”, afirma Geraldo Ballone, professor de psiquiatria da PUC Campinas. A maioria das comunidades espíritas não considera a cura espiritual um simples efeito placebo, mas concorda que o tratamento deve servir como um apoio ao doente. “Nos preocupamos para que não haja fanatismo’, afirma Cristiane Lobas, superintendente da entidade Nosso Lar. “Sabemos que a cura espiritual pode acontecer, mas sempre orientamos as pessoas a que procurem ajuda médica. O tratamento que oferecemos é um coadjuvante.”


O mistério da psicografia

Como os médiuns conseguem dar detalhes do morto nas mensagens que psicografam?

Quando todas as tentativas de cura falham e a morte chega, muita gente acaba recorrendo novamente aos médiuns. Desta vez, para se segurar em outro tipo de esperança: a de que o familiar que morreu esteja vivo – e em paz – em outro mundo. É aí que entram aqueles a quem se credita o dom de falar com os mortos por meio de pinturas, ouvindo vozes ou em cartas psicografadas. A psicografia é objeto de discussão há muitas décadas, especialmente após o mineiro Chico Xavier ficar famoso. Durante seus 92 anos de vida, ele escreveu milhares de mensagens, que foram compiladas em mais de 400 livros. As cartas particulares, com nomes, apelidos íntimos e sobrenomes de pessoas mortas, fizeram dele um consolador das tristezas do luto. E despertaram a curiosidade sobre o que estaria por trás daquelas misteriosas linhas.
Perito especializado em análises datiloscópicas e grafotécnicas, Carlos Augusto Perandréa analisou a carta atribuída a Ilda Mascaro Saullo, que morreu de câncer em 1977 na Itália. O bilhete em italiano, língua que o médium desconhecia, foi comparado com um cartão-postal escrito por Ilda. A pesquisa transformou-se no livro A Psicografia à Luz da Grafoscopia, que detalha, por exemplo, que as letras “t” do cartão escrito por Ilda e da carta de Chico Xavier tinham o mesmo tipo de ligação com as demais, a mesma abertura das hastes e a mesma barra de corte da letra. Segundo o perito, a mensagem era um híbrido entre a forma de escrever do médium e da italiana.
O depoimento de parentes que tiveram cartas psicogradas também impressiona. Para a juí za Douglasy Velloso, a despedida do pai chamando-a de Cuca trouxe a certeza de que era ele por trás da carta psicografada pela médium Martha Thomaz. Douglasy visitou o centro espírita Grupo Noel em abril, para ter notícias do pai. “Ele me chamava de Cuca e ninguém ali sabia disso”, diz ela.
Segundo estudo de Paulo Rossi Severino, que analisou 45 cartas psicografadas por Chico Xavier, 35% dos parentes consideraram a assinatura idêntica à do morto e 42% conseguiram enxergar alguma peculiaridade que o médium não teria como conhecer. Esses números podem comprovar duas visões opostas. Primeiro, que uma parte considerável das cartas parece ter origem no contato com uma pessoa morta. Segundo, que a maioria das cartas não contém semelhanças com a letra do falecido nem revelações da família.
Para muitos cientistas, esses números são suficientes para afimar que tudo não passa de acaso. “A tradição científica entende que as informações certas que o médium passou nas cartas foram apenas coincidência”, afirma o psiquiatra Frederico Camelo Leão, da USP. “Quem procura outra explicação deve tentar encontrá-la na religião.”
E a sensação comum entre os médiuns de acreditar que não foram eles que escreveram aquilo que psicografaram? Numa entrevista descrita no livro Por Trás do Véu de Ísis, de Marcel Souto Maior, Chico Xavier faz a pergunta: “Serão real mente dos nomes que as assinam as páginas então produzidas? Eu não poderia responder precisamente, porque a minha consciência como que dorme. De uma coisa, porém, julgo estar certo: não posso considerar minhas essas páginas porque não despendi nenhum esforço intelectual ao grafá-las”. Psicólogos e psiquiatras explicam esse fenômeno a partir da idéia de inconsciente. Como acontece com sonâmbulos ou pessoas em transe, nossa mente pode nos levar a ações que não faríamos em condições normais. “Hoje sabemos que o inconsciente pode levar o homem a fazer coisas extraordinárias, sem que a autoria precise ser atribuída a outros seres”, afirma o psicólogo e filósofo José Francisco Bairrão.
No que psicólogos e médiuns concordam é que a psicografia pode servir de consolo para quem enfrentou a morte de um parente querido. Cartas psicografadas têm em comum mensagens de esperança, amparo à família, amor e perdão. Segundo a pesquisa de Paulo Rossi Severino, o conselho para cultivar pensamentos positivos está em 82% das mensagens. Como a carta em que o filho pede aos pais: “Devo pedir que vocês não escutem, em momento algum, a voz da revolta”. Ou ainda: “Mãezinha e papai, nós continuamos sendo apenas um, pois o nosso amor é imortal, porque trazemos em nossa alma a imortalidade”.
“O luto é um processo de reparação e elaboração da perda. As pessoas buscam uma série de formas de lidar com suas dores, e a psicografia, inserida na questão religiosa, é uma delas”, afirma a psicóloga Maria Julia Kovács, coordenadora do Laboratório de Estudos sobre a Morte da USP. Tem mais. A seguir, você vai ver que a mediunidade não apenas apóia as pessoas que têm de lidar com a morte como também está ajudando policiais brasileiros e americanos a esclarecer assassinatos e encontrar criminosos.


Os médiuns a serviço da justiça

Eles ajudam a polícia a esclarecer crimes – e também podem atrapalhar as investigações.
A gaúcha Iara Marques Barcelos estava presa havia dois anos acusada de ter assassinado o amante, o tabelião Ercy Cardoso. “Ela negava o crime, mas eu não tinha provas de sua inocência”, diz Lucio de Constantino, o advogado de defesa. Foi então que, em 2006, a família de Iara apareceu com uma carta psicografada. A mensagem tinha sido escrita num centro espírita de Porto Alegre e era atribuída ao homem assassinado. “O que mais me pesa no coração é ver a Iara acusada desse jeito, por mentes ardilosas como as dos meus algozes”, dizia a carta. O advogado decidiu juntar o texto às provas do processo. E os jurados acabaram inocentando Iara.
Em 1925, o escritor britânico Arthur Conan Doyle afirmava que no futuro os policiais seriam ou, pelo menos, contratariam médiuns para resolver crimes. A previsão do célebre pai de Sherlock Holmes se mostrou correta. Nos EUA, já existe um grande comércio envolvendo detetives, policiais e médiuns, que costumam cobrar cerca de US$ 1 000 para dar dicas de desaparecimentos e também de crimes sem solução.
Os detetives mediúnicos usam uma técnica chamada pelos espíritas de psicometria: juntam o nome da vítima e a data do crime e, com a ajuda de algum objeto do morto, se colocam na pele da pessoa agredida e dão detalhes sobre local, causa da morte e culpados. Cabe aos policiais verificar as dicas.
“Sei que sou contratada como último recurso, quando a polícia já não sabe mais o que fazer com o caso”, diz Noreen Renier, uma médium investigativa que fez fama resolvendo casos misteriosos. De acordo com sua contabilidade, ela já participou em mais de 600 investigações, a maioria com sucesso. Além do delegado da Flórida, do começo desta reportagem, ela ajudou um agente do FBI a encontrar o lugar exato de um avião desaparecido. Noreen foi a única vidente que deu palestras no FBI sobre suas técnicas.
A relação tão próxima entre criminologia e espiritualidade nos EUA é mais comum do que se imagina. Apesar de quase não existirem estudos sobre o assunto (os investigadores não gostam de admitir que precisam desse recurso tão pouco científico para resolver crimes), uma pesquisa feita em 1993 com delegacias das 50 maiores cidades americanas indicou que 35% delas já tinham se valido de médiuns. Mas é tudo por baixo dos panos. Oficialmente, o governo americano nega. O FBI e o Centro Nacional de Crianças Desaparecidas rejeitam a possibilidade de trabalhar com videntes.
O que os mais céticos dizem é que na maioria dos casos não são os policiais que procuram os médiuns, mas o contrário. “Por lei, a Justiça tem de ouvir todas as pessoas que entram numa delegacia falando que têm informações sobre um crime. Isso atrasa o trabalho, porque toma muito tempo ir atrás das pistas, inclusive daquelas sem fundamento”, afirma o ilusionista americano James Randi, que ofereceu US$ 1 milhão a quem provar que fenômenos sobrenaturais existem. De fato, o caso da menina inglesa Madeleine McCann, que desapareceu em uma praia portuguesa em 2007, recebeu mais de 1 000 palpites de videntes. Alguns foram testados, mas até hoje nenhum acertou o paradeiro da menina.
A maior crítica que se faz a esses profissionais é que eles não colhem informações por meio de um dom sobrenatural, mas por adivinhação. É muito comum médiuns darem dicas vagas, como “o corpo está num lugar deserto” ou “eu vejo água”. A partir de dados que a própria família da vítima passou, o vidente dá informações óbvias e mede a rea ção dos clientes. Assim, a pessoa se ilude e pensa que o médium está dizendo novidades.
No Brasil, a relação entre médiuns e Justiça tem características muito particulares e envolveu até o mais conhecido espírita do país, Chico Xavier. Em 1976, um caso de assassinato em Goiânia seria um bom enredo para filme de ficção. José Divino Nunes, então com 18 anos, foi acusado de matar seu amigo de infância, Maurício Garcez Henrique, com um tiro no peito. O processo contra José Divino corria na Justiça havia dois anos quando os pais da vítima receberam uma carta psicografada por Chico Xavier, de autoria de Maurício. O texto inocentava o amigo e dizia que o morto estava muito incomodado com a acusação contra José. “Fui eu mesmo quem começou a lidar com a arma”, afirma a carta, que dava detalhes da cena do crime. Também mandava lembranças à família por meio de Xavier, que morava em Minas e não conhecia o caso. O que chamou a atenção de todos os jurados foi a assinatura da carta, semelhante à do assassinado. Numa decisão inédita no país , o documento foi incluído no processo e José Divino, inocentado.
A Justiça brasileira permite que os advogados usem cartas psicografadas como provas judiciais, mas elas podem ser facilmente contestadas pelos adversários no processo. “Não é ilegal usar documentos psicografados, mas isso só funciona porque quem os avalia são os jurados, que têm cultura e religiãovariadas”, afirma Renato Marcão, jurista e promotor público de São Paulo. “Já que não há como checar a fidelidade desse tipo de informação, nada impede que seja retirado do processo.”
Ainda restam perguntas sobre o assunto. Por que o espírito nunca revela o real culpado na carta psicografada? Será que todos os médiuns detetives contam apenas com a sorte para resolver crimes? Por via das dúvidas, é bom não se esquecer do caso da americana Sylvia Browne. Há mais de 40 anos, a vidente ajuda a resolver assassinatos e desaparecimentos – e dá palestras semanalmente em um programa de televisão. Em 1999, a avó de uma menina desaparecida foi pedir conselhos a Sylvia. A resposta que ouviu foi digna dos episódios de CSI: “Ela não está morta. Foi colocada num barco e levada para o Japão, onde virou escrava.” A avó gelou. Alguns meses depois, porém, o molestador de crianças Richard Lee Franks confessou ter matado a menina. Ao contrário de todas as outras vezes em que alardeou seus talentos mediúnicos, Sylvia não se pronunciou sobre esse caso. O corpo estava enterrado não no Japão, mas a menos de 20 quilômetros de casa.


As flores de Claudia Rosa
Claudia Rosa estava lavando louça em casa quando ouviu vozes: “Pega lápis e papel”. Acostumada com sua mediunidade desde os 18 anos, a dona-de-casa resolveu obedecer. Sentou-se à mesa e pintou as formas geométricas que as vozes pediam. Depois as coloriu com giz de cera, mas ainda não estava satisfeita. Foi a uma loja de material de pintura e lá se deixou guiar para comprar telas e tinta acrílica. Claudia Rosa não era artista, mas acabou se especializando em pintar com as mãos. Os temas florais são os favoritos dos espíritos que ela crê receber. Nenhum quadro demora mais de 15 minutos para ficar pronto.


De engenheiro a médium de cura

O engenheiro mecânico Eduardo Monteiro é médium de doação de energia nas cirurgias espirituais. “Enxergo uma bruma, como se o chão fervesse, e transfiro isso para o paciente”, diz Eduardo, de 52 anos, que já fez pintura mediúnica e acredita ter incorporado um espírito. “Sempre me questiono se o que vejo não é ilusão, já que sou um cara cético, da matemática. Mas o plano espiritual dá uma comprovação cada vez que fico muito questionador”, afirma.


As vozes de Nancy

A enfermeira Nancy Cesar foi criada em uma família católica. Na adolescência, as missas dominicais eram obrigatórias – até atrapalhavam quando ela queria sair nos sábados à noite. Nancy só percebeu que talvez estivesse seguindo a religião errada quando, aos 20 anos, começou a apresentar comportamentos estranhos. Às vezes, sem perceber, o tom da sua voz mudava. Dizia coisas desconexas e não se lembrava do que havia dito. Nancy passava mal e se apavorava com a sensação. Hoje, aos 46 anos, depois de ter estudado a doutrina espírita por mais de uma década, ela se considera uma médium. Acredita que seu dom é a polifonia. “Eu nem escuto, mas os espíritos falam pela minha voz.”


Texto Aryane Cararo e Karin Hueck
Revista Super Interessante
maio2008