“Para filosofar precisamos aprender a ciência do mergulho em nós mesmos.” (J.H.Pires)
Há uma grande importância no significado prático da filosofia e da filosofia espírita, como grandes incentivadores à reflexão que faculta o autoconhecimento e abre amplas perspectivas ao entendimento das magnas questões humanas e espirituais.
Se pensarmos em filosofia apenas como uma disposição para o pensar, estaremos minimizando a sua importância no contexto da história humana.
Na filosofia, aprendemos a analisar os elementos que compõem a existência do ser-no-mundo; e isto, porque há em nós uma inquietação existencial congênita.
Já a filosofia espírita amplia essa busca, e revela a existência do ser interexistente em infinitas dimensões temporais, evolutivas, manifestando as suas luzes ou suas sombras nas formas concernentes ao seu nível de consciência.
A filosofia busca respostas, eleva-se, desenvolve-se, reflete-se, retoma ao reconsiderar as respostas anteriores. Não conclui, apenas conduz.
E é nessa caminhada que o ser se descobre, na constante e infinita perquirição de si mesmo. O personagem shakesperiano, Hamlet, frente ao espelho, e com os restos mortais de seu bobo-da-corte à frente, abre essa perspectiva angustiante do nada, do vazio desconcertante e avassalador que nos toma de assalto frente ao silêncio da morte.
A grande questão, ele diz, está no ser, ou no não-ser? É nisto (restos mortais) que nos transformamos?
O existencialismo – ou a angústia de existir – exorta o homem a existir inteiramente “aqui” e “agora”, para aceitar sua intensa “realidade humana” do momento presente – o futuro não é outra coisa que visões e ilusões para dar ao nosso presente direção e propósito.
“Cem anos após Kardec, a filosofia na França quase se desfez nos sofismas do nada, com Jean Paul Sartre e sua escola. Mas Simone de Beauvoir, companheira e discípula de Sartre, confirma e ilustra as considerações de Kardec, ao escrever: ‘...detesto pensar no meu aniquilamento.
Penso com melancolia nos livros lidos, nos lugares visitados, no saber acumulado e que não mais existirá.(...)’, em La Force des Choses”. A aproximação da morte, sob a idéia do nada, acarreta às criaturas mais cultas essa desesperança amarga. (PIRES, J.H.).”
É sob essa angustiante perspectiva que a inteligência humana tem buscado minimizar a realidade inegável e irrecusável da morte. O Pensador (Le Penseur) é uma das mais famosas esculturas de bronze do escultor francês Auguste Rodin. Retrata um homem em meditação profunda, num gestual próprio de quem está em luta com uma poderosa força interna.
Tornou-se arquétipo do pensar filosófico como busca de si mesmo. Todos aqueles que já conseguiram ultrapassar a superfície do existir como usufruto das formas, mesmo porque elas trazem em si mesmas o sinal de sua intrínseca fragilidade, se identificam com essa figura.
O Pensador traz a angústia da forma dilacerada pelo sofrimento; quase disforme, desproporcional, transmite o intenso drama interior de que é portador. Seu cenho carregado, oculta o olhar que permanece voltado para baixo.
Ele não busca respostas no céu acima de seu pensamento, mas na terra abaixo de seus pés. Ele não demonstra um pensar sereno, mas uma dor atormentada pela ausência de respostas. Está nu.
Abandonado ou desprovido das ilusões que pudessem ocultar-lhe a própria realidade, ele se expõe. E deixa uma das mais eloquentes mensagens ao ser humano atual: a verdadeira realidade do ser não jaz aqui, na temporalidade perecível, mas na imortalidade daquele que pensa: o Espírito.
As “previsões” de grandes tragédias por acontecer, através do cinema e da TV, retratam, metaforicamente esse drama atual: o ser humano, perdido em seus dramas interiores quer destruir a si mesmo, destruindo a fonte de sua própria existência – o planeta em que vive.
Outros autores cujas obras estão hoje nas telas, utilizam-se dos sentidos humanos (Babel, Ensaio sobre a Cegueira), para um novo mergulho dentro de si, através do mundo sensível, buscando trazer à tona as suas tragédias pessoais projetando-as aos seus semelhantes num movimento catártico, em busca de identificação.
Em 25 séculos de filosofia, temos inumeráveis doutrinas contraditórias.
Nenhuns dos pensadores ocidentais estiveram de acordo com relação às suas proposições. Há uma insatisfação profunda, gerada pela ausência de concordância. A meta final deve ser a realização, mas quem a conseguiu até agora?
Louvemos todos aqueles que tentaram. Seus esforços imortalizaram a trajetória do espírito humano em sua infinita jornada pelo autoconhecimento. Mesmo aqueles que se perderam no próprio vazio.
Assim agiram pela absoluta necessidade de identificação com o outro, e todos, com Deus.
“Deus está morto”, disse Nietzsche, certa vez.
O deus apresentado pelas religiões, este sim, está morto. Morreu por falta de misericórdia, por ausência de amor ao próximo.
Morreu por asfixia, mergulhado nos milhões de moedas geradas pela arrecadação criminosa obtida da ingenuidade e da falta de conhecimento.
Morreu em cada ritual vazio de respostas, que perpetua a crença de que a crucifixão é nossa libertação (!?).
Morreu em cada ser mutilado ou assassinado por balas perdidas ou bombas amarradas ao próprio coração daquele que O busca em desespero. Morreu em cada árvore caída, em cada rio poluído, no super-aquecimento do ar que respiramos.
Morreu ainda, pela ausência de amabilidade, cordialidade e respeito mútuo entre aqueles que se dizem seus seguidores.
Herculano cunhou a expressão “agonia das religiões” (PIRES, J.H.), para bem definir esse processo de transmutação da ostentação para a interiorização. Ostentação da fé, para auto afirmar-se. Para perpetuar a representação olímpica do deus humano sobre a Terra, na figura daqueles que insistem em representá-lo.
Deus não tem representantes. Tem filhos. E foi o maior deles, desfigurado pelo psiquismo arquetípico humano, fazendo de sua pessoa e de suas ações projeções de um herói mitológico, filho de um deus com uma mortal, e, portanto portador de virtudes milagrosas e espetaculares, misto de herói-mártir-guerreiro, que veio libertar-nos do Mal, igualmente projetado na figura arquetípica do anjo decaído que persiste em atormentar os seres humanos com doenças e flagelos, que surge entre nós, num dos momentos mais graves de nossa evolução.
Renascido na doutrina espírita, de forma igualmente simples, assim como viera em pessoa na manjedoura de luz, Jesus transfigura-se no Ser completo, naquele que é uno com o Pai porque identifica-se com suas leis, em sua consciência dilatada pelo Amor aceito porque compreendido.
No formato de Filosofia, o Espiritismo sintetiza os esforços humano em busca de si, ilustrado pela imagem de O Pensador.
Como Filosofia, analisa os elementos que compõem, sim, a existência do ser no mundo, porém, acrescidos da grande jornada que o aguarda na linha do tempo, fora deste mundo também.
O Ser é – jamais poderia não ser.
O existencialismo kierkegaardeano, nietzscheniano, sartreano, serviu como uma lâmpada vermelha a pulsar, intermitente, como a dizer: acordem! A angústia beauvoiriana frente às possíveis perdas de seus tesouros intelectuais com o apelo inequívoco da morte permanece no coração das mães e dos pais que perdem seus filhos adolescentes para as drogas, para o álcool, para o crime, para a sexualidade em patológico desvario.
A desesperança gerada pelo “escândalo” tem seu lenitivo na filosofia dos Espíritos Superiores; Sócrates a antecedeu, com a sua amorável vivência ético-moral com bases na lógica incontestável da Verdade. Platão, com a realidade do mundo das ideias que jazia acobertada no fundo da caverna.
Aristóteles, a premência do mundo das formas a delinear a persona e suas realizações.
A Filosofia Espírita não é instrumento para mera elucubração.
Nem tampouco de ostentação frente aos troféus humanos e mundanos. É sim uma alternativa, um convite (por ora) para a mudança do atual sistema de pensar.
O pensar filosófico-espírita prevê um universo de auto-descobertas, porém, impõe nesse processo, o reconhecimento da presença de Deus em nós através de suas leis, condutoras de nossa lógica, de nosso desenvolvimento, de nosso evoluir, de nossa amorosidade.
As Leis Morais didaticamente definidas pelos Espíritos a Kardec, representam parte do processo de conscientização e de reconhecimento do divino em nós.
Não-ser é o desvario acima descrito; não ser compõe os torpes sentimentos que nos afastam uns dos outros: a inveja, a soberba com sua filha, a prepotência. Esses elementos, poderosos em sua capacidade auto e alo destrutiva, faz estagnar o ser em sua nulidade existencial. E proclama a sua necessidade de sofrer para despertar.
Tal jornada ainda não terminou.
O exemplo de Jesus permanece como uma imagem-mensagem subliminar a permear o nosso momento existencial. Seu apelo continua pulsando nos corações humanos. A leitura desse chamamento tem sido decodificada de forma errada.
Porém, ele continua ali. E quando o ser fartar-se de não ser, abrirá seu coração e sua mente para o banquete – não o platônico, como representação do sensível, mas o nupcial, o inteligível, porque pleno de alegria, esperança e identificação com Deus.
Sonia Theodoro da Silva
São Paulo-SP
Brasil
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Fontes e créditos
http://filosofiaespiritacomjapao.blogspot.com/
http://nejanucleoespiritajoannadeangelisjp.blogspot.com/
Adequação , adaptação de imagens
Grupo -NEJA-JAPÃO