Deve existir pelo menos quinhentos milhões de budistas vivendo hoje em dia, espalhados pelo mundo, mas a situação era bem diferente quando o próprio Buda estava pregando!
Buda era príncipe de nascimento, mas desgostoso com as condições ignorantes com as quais o homem se havia resignado - as condições de tristeza e de sofrimento - deixara seu palácio em busca da luz.
Depois de longa e árdua penitência, descobriu que o desejo estava na raiz de toda a miséria humana e que, se o homem pudesse ficar completamente livre do desejo, conseguiria a paz e a bem-aventurança. Porém, ele sabia que não era possível a todos ficarem totalmente livres de desejos.
Contudo, persistiu em dizer a verdade aos homens, pois pensava que haveria algum benefício se eles aprendessem alguma coisa. O homem poderia ser feliz, até certo ponto, se ganhasse controle sobre sua avidez e outras paixões.
Assim, Buda, com um punhado de discípulos, errou pelo país, espalhando sua mensagem entre o povo. No início de sua missão, poucas pessoas o ouviam. Não apenas isso, havia ocasiões em que era expulso das portas e lhe recusavam até mesmo abrigo por um pouco.
Certa vez, num dia de verão, quando o sol abrasador queimava no céu, Buda sentou-se e, reclinando-se sob uma árvore à beira da estrada, suava profusamente e parecia cansado.
Um de seus jovens acompanhantes, que sabia de que maneira luxuosa Buda havia passado sua infância, pensou consigo mesmo: “Nesta hora, ele poderia estar confortavelmente descansando em seu palácio num divã de marfim, com donzelas encantadoras abanando-o ou aspergindo água fria e perfumada sobre ele, com músicos tocando doce acalanto do lado de fora de seu dormitório. Mas que pena! Que vida dura ele escolheu!”.
À medida que o jovem pensava mais sobre isso, lágrimas escorriam pelo seu rosto.
Isso não escapou à atenção de Buda que perguntou:
“O que o faz tão triste?”
“Meu Senhor!”, explicou o jovem, “que outros não saibam, mas eu sei que o Senhor é o Divino. Se quisesse, poderia dar iluminação e bem-aventurança a todas as pessoas instantaneamente. Em vez disso, por que se dá ao trabalho de viajar e falar a pessoas sem caridade?”
Buda ficou quieto, mas sorriu, e isso foi bastante para encher de paz o coração do discípulo.
Dias depois, durante um semelhante meio-dia tórrido, quando descansava sob uma árvore nas proximidades de uma aldeia, Buda chamou o mesmo jovem para seu lado e disse: “Meu filho, vá à aldeia mais próxima; procure todos os chefes de família e pergunte-lhes o que mais desejam, o que os faria felizes e satisfeitos!”
Imediatamente, o jovem partiu para a aldeia vizinha, como lhe fora ordenado, enquanto o Mestre aguardava no local. Já era quase noite quando o jovem retornou.
“Quantas pessoas você encontrou? O que responderam às suas perguntas?” - indagou Buda.
“Meu Mestre! Visitei uma centena de casas e encontrei os chefes de famílias. Cinquenta deles disseram que seriam felizes se seus filhos fossem venturosamente casados e estivessem estabelecidos na vida. Dez desejavam melhores casas para morar, e outros dez disseram que seriam felizes se fossem curados de suas doenças. Dos restantes vinte, metade desejava ser famosa, e o mais apaixonado desejo da outra metade era sair vitoriosa dos litígios em que estava envolvida”, declarou o discípulo.
“Quantas pessoas queriam liberação de desejos? Quantos disseram que seriam felizes se conseguissem iluminação?”, perguntou Buda.
“Meu Senhor! Nem mesmo um!”, gaguejou o discípulo.
Buda sorriu e disse:
“Veja meu filho, como posso eu dar a alguém aquilo de que ele não sente a menor necessidade?”
O discípulo ficou silencioso. E, em silêncio, compreendeu o significado do longo trabalho de Deus entre os homens através dos séculos.
Fonte- (Texto extraído do livro “Histórias da Índia Antiga” – Editora Shakti.)
Por Maria Afonso