2015-09-15
O GUERREIRO ESPIRITUAL
"Ser um guerreiro espiritual significa desenvolver um tipo especial de coragem que é, desde a sua origem, inteligente, bondosa e destemida.
Os guerreiros espirituais podem ainda ter medo, mas mesmo assim eles são corajosos o bastante para experimentar o sofrimento, para relacionar-se de maneira franca com seu medo fundamental e, sem fugir, extrair lições das dificuldades."
Sogyal Rinpoche
in "O Livro Tibetano do Viver e do Morrer"
O deserto do reencontro
A questão é muito séria que se avizinha, o guerreiro em uma hora tem que aceitar tal questão, ele então deverá afastar-se de tudo e de todos, exatamente todos, se tornando como nuvem, e sendo assim, como dizia Don Juan, matará a sua história pessoal.
A história pessoal é um conjunto de coisas tão pesadas que torna-se uma prisão sem grades, um aprisionamento do ser em possibilidades antevistas de acordo com as relações, pessoas próximas, repetições sentimentais, repetições de dramas e de alegrias, um conjunto que envolve a história social e a história íntima.
Nenhuma delas é verdadeira, ambas são forjadas como aparências que acabam encobrindo a verdade: o véu é tecido por cada um...
Uma parte da história pessoal é a história íntima, a que guardamos só para nós, aquela que acreditamos mais fielmente ser verdade, aquela que nos entregamos na intimidade, naquilo que acreditamos serem nossos sonhos, nosso eu verdadeiro, mas isso também é uma construção.
Uma parte mais fácil de detectar o logro é a história social, aquela montada para a sociedade, para os outros, para fora. Esta é mais facilmente visível como ilusão, claro que todos sabem forjar papéis para cada situação da vida, para cada ocasião, como são as roupas, prontas para cada evento ou festa que iremos no dia.
Mas todas elas são ilusões, o que somos na verdade é uma composição de uma trama, uma trama de filamentos energéticos que trazem consigo histórias de seres que compuseram antes de nós. Somos a somatória de todos estes seres.
Gosto bastante da analogia de Nuvem que Passa, aquele velho guerreiro dizia que somos como um tapete, quando morremos e permitimos a nossa dissolução, somos desfiados e estes fios vão juntar-se ao novelo do grande tecelão cósmico, que os juntará com outros fios e criarão novos seres: humanos, cavalos, sóis, planetas, estrelas, inorgânicos e orgânicos de toda a sorte.
Olhar para dentro de si é voltar a máxima do "conhece-te a ti mesmo" e conhecendo cada aspecto do ser, saberemos o que realmente somos: um conjunto de experiências regidos pelo brilho ou opacidade de uma consciência.
Já dizia Don Juan que somos um emaranhado de filamentos de luz, estes filamentos são esses fios tecidos no ser que hoje somos. A nossa consciência é dada pela intensidade do brilho do ponto de aglutinação, que por sua vez determina a nossa percepção de mundo. Podemos dizer então que a percepção é uma composição do ponto enfatizado dentro de nós somado à nossa consciência.
Mas a questão central é saber o que movimenta esse ponto de aglutinação, e mais ainda, como fazê-lo deliberadamente, com a força da própria consciência e não regido por fluxos externos de inconsciência.
Acostumamos e domesticamos, além de aceitarmos a domesticação de nosso ponto de aglutinação para perceber o mundo de uma certa forma e para reagir de uma determinada forma diante de determinadas situações, isso é o condicionamento.
Somos condicionados diante de estímulos e respostas, de punições e recompensas e com isso acostumamos a sermos o que "devemos ser" diante de certas situações sociais ou diante de certos dilemas pessoais.
A história pessoal se torna um manual de vida no começo, depois uma lei, depois uma corrente e um chicote que impõe que as condutas sejam tais e quais ensinadas ao longo da caminhada.
Romper com esse manual une-se a indissociável necessidade de se conhecer, saber de onde foi gerado cada condicionamento, cada laço que prende a percepção e o ponto de aglutinação em um determinado aspecto de nosso ser total.
Descobrindo a origem de cada condicionamento conseguimos desatar os nós, pois chegando a origem descobrimos que o que parece real é irreal de todo, é um fantasma sem forma e sem possibilidade de nos ditar nada, exatamente nada.
Quando rompemos os laços, e só rompendo os laços, conseguimos ver o nosso ponto de aglutinação livre e conseguimos explorar os outros aspectos interiores de nosso ser, explorar diversos pontos de vista do mundo, explorar os outros aspectos de nosso ser interior, e só conhecendo todos os aspectos, livres do condicionamento social, estaremos dando o primeiro passo rumo à liberdade de fato.
A prisão é então não um fato externo, a prisão é interna, cada um forja a própria prisão, dia a dia, condicionando-se para a sociedade e para si mesmo, forjando mentiras, falsos laços, falsos sentimentos, e escondendo a possibilidade de exploração de nosso ser total interior.
Temos que entender cada aspecto, os que nos pareçam bons, os que nos pareça ruins, temos que descer ao inferno que reside dentro de cada um de nós, subir ao céu e ver que tudo isso são valorações sem sentido que respondem a estímulos sociais condicionantes de recompensas e castigos.
Ligamos o que é condicionado socialmente como errado a um castigo e a algo mal, e isso impede que exploremos este aspecto, e fazendo isso estamos matando uma parte dentro de nós mesmos.
O exercício é conhecer-se e permitir-se, conversava isso com uma amiga recente, e lembre dos ensinos de Don Juan, de Budha e a vinculação entre eles foi de uma clareza sem igual.
Ontem entendi isso, três aliados me informaram isso em um sonho, estes seres me mostraram com uma clareza sem par o que estava na cara, o que uma amiga conversava comigo, temos que seguir um caminho. Eles me apontaram e eu não entendi porque, e se seguisse cegamente estaria mais uma vez seguindo um condicionamento, mas a questão foi além.
Eu entendi que temos que seguir um caminho solitário até nos entendermos, e só estaremos prontos a conviver uns com os outros quando realmente estivermos dispostos a nos conhecer em nossa totalidade.
A nossa totalidade reconhecida nos dá a liberdade, e quando estamos completos paramos de despejar expectativas e frustrações nas outras pessoas, entendemos que o trabalho é de cada um dentro de si.
As pessoas digladiando-se, as pessoas idolatrando umas as outras, as pessoas seguindo mestres, estas pessoas todas são incompletas, tanto as que ensinam quanto as que estão a aprender, são incompletas pois não se ensina a viver, não se aprende a viver, apenas se vive, e todo conhecimento é dentro de cada um de nós.
Conhecer-se acalenta o buraco de cada ser humano, aquele buraco que afoga as pessoas, aquele buraco que causa depressão, aquele buraco que faz uma pessoa pensar ser especial e diferente das demais.
Conhecer-se faz com que saibamos que todos tem seus aspectos desconhecidos e projetam este desconhecido nos demais: projetando admiração, dor, tristeza, rancor, inveja - todos aqueles processos que na verdade são um extravasar dos seus desconhecidos internos.
O tempo deste caminho se chega, o tempo em que outros mestres como Jesus, Budha, Don Juan se afastaram de todos e isolados de todos reconectaram-se a si mesmos, e só assim puderam estar completos, e só completos puderam estar livres para realmente manter uma relação direta e sincera com as demais pessoas e energias todas deste universo....
Vento que sussurra
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